As potestades do mal e o diálogo necessário
Jung Mo Sung *
Adital -
"O dado mais marcante do mundo moderno é o crescimento acelerado de
Adital -
"O dado mais marcante do mundo moderno é o crescimento acelerado de
um novo tipo de sociedade -a sociedade de consumo.
"A sociedade de consumo é um fruto da técnica e do capitalismo. Historicamente,
"A sociedade de consumo é um fruto da técnica e do capitalismo. Historicamente,
ela apareceu no mundo ocidental quando a burguesia ascendeu ao poder político e
colocou a técnica a serviço de seu próprio enriquecimento. A propriedade privada,
que na sociedade pré-industrial havia servido para dar segurança às pessoas comuns,
deixou de cumprir uma função social e se transformou num direito absoluto.
Surgiram as grandes indústrias capitalistas. A palavra de ordem passou a ser o
aumento constante de produção, ainda que boa parte dela consistia em trivialidades [...].
Toda outra atividade que não incidisse diretamente no desenvolvimento industrial
seria relegada a um plano secundário. As relações trabalhistas estariam
regidas fundamentalmente pelo princípio da conveniência pessoal dos proprietários
da indústria, para os quais a propriedade seria um meio de enriquecimento e
não um instrumento de serviço à sociedade. Os meios massivos de
comunicação (especialmente o rádio e a televisão) seriam utilizados para condicionar
os consumidores a um estilo de vida em que se trabalha para ganhar, se ganha para
comprar e se compra para valer. Como demonstrou Jacques Ellul, ‘o estilo de vida
é formado pela publicidade’. A publicidade está controlada por gente cujos
interesses econômicos estão ligados a aumento de produção, e este, por sua vez,
depende de um consumo que somente é possível numa sociedade na qual viver é
possuir. A técnica é assim colocada a serviço do capital para impor a ideologia de consumo".
"A ideologia do consumo se impões no mundo moderno, inclusive em lugares onde
"A ideologia do consumo se impões no mundo moderno, inclusive em lugares onde
a miséria domina. Os meios massivos de comunicação se encarregam de difundir,
tanto nos bairros ricos como nas favelas dos grandes centros urbano, a imagem de
felicidade, o homo consumens. O resultado é que o mundo inteiro vai transformando-se
numa ‘aldeia global’ que encontra no consumo seu princípio de unidade".
"Por trás do materialismo que caracteriza a sociedade de consumo estão os
"Por trás do materialismo que caracteriza a sociedade de consumo estão os
poderes de destruição a que se refere o Novo Testamento. O apóstolo Paulo
particularmente discerniu que os principados e potestades do mal estavam
entrincheirados em estruturas ideológicas que oprimiam os homens [cf. Ef 6,12]."
"A vigência destes conceitos paulinos é óbvia quando se compreende o caráter
"A vigência destes conceitos paulinos é óbvia quando se compreende o caráter
idolátrico e o poder de condicionamento da sociedade de consumo. Traduzido na
linguagem da sociologia moderna, o vocabulário do Apóstolo aponta para
instituições e ideologias que transcendem ao indivíduo e condicionam seu pensamento
e seu estilo de vida. Tanto aqueles que circunscrevem a ação dos poderes do mal ao
terreno do ocultismo, da possessão demoníaca e da astrologia, como os que consideram
que as referências neotestamentárias a estes poderes são uma mera casca mitológica
da qual é necessário extrair a mensagem bíblica, terminam reduzindo o mal a um
problema pessoal e a redenção cristã a uma experiência individual. Uma alternativa
melhor é aceitar o realismo da descrição bíblica e entender a situação do homem no
mundo em termos de escravidão a um mundo espiritual, do qual necessita ser liberto. [...]
Em sua rebelião contra Deus, o homem é escravo dos ídolos do mundo, por meio dos
quais atuam estes poderes. E os ídolos que hoje escravizam o homem são os ídolos
da sociedade de consumo."
"A igreja está chamada a encarnar o Reino de Deus em meio aos reinos deste mundo.
"A igreja está chamada a encarnar o Reino de Deus em meio aos reinos deste mundo.
O evangelho não lhe deixa outra alternativa. A fidelidade ao evangelho tem
como concomitante o conflito com o mundo. [...] O conflito é inevitável quando a igreja
toma a sério o evangelho. Isto é tão verdadeiro hoje na sociedade de consumo como
o foi no primeiro século".
Estas palavras parecem ser escritas hoje por algum teólogo da libertação. Mas, na
Estas palavras parecem ser escritas hoje por algum teólogo da libertação. Mas, na
verdade, foram escritas em 1976 por um teólogo batista colombiano - radicado na
Argentina-, René Padilla, que pertence a um setor do cristianismo conhecido como
evangelical e é um dos principais nomes da "teologia da missão integral". Eu reproduzi
estas palavras (do livro Missão Integral), não somente porque são extremamente atuais,
mas para mostrar que a teologia da libertação não tem e nem teve, na América Latina,
o monopólio sobre a reflexão teológica comprometida com a causa dos mais pobres e
com a justiça social.
Nem todos cristãos, Igrejas ou documentos eclesiásticos que lutam pela justiça
Nem todos cristãos, Igrejas ou documentos eclesiásticos que lutam pela justiça
social são "filiados" à teologia da libertação. O "cristianismo de libertação" é mais
amplo do que a TL ou as CEBs. Eu penso que é importante lembrarmo-nos
disto para reduzirmos todas as formas de cristianismo que lutam por justiça social
à TL (que aparecem em muitos textos pró-TL que circulam na Internet nestes dias).
Pois isto seria não reconhecer e respeitar outros grupos que lutam por uma sociedade
mais humana em nome da mesma fé cristã, mas que pertencem a outras correntes
teológicas e eclesiais. Sem este reconhecimento não é possível um diálogo
frutífero e necessário em torno desta mesma luta.
Aliás, é estranho ver que para muitos grupos cristãos "filiados à TL" é mais fácil ou
Aliás, é estranho ver que para muitos grupos cristãos "filiados à TL" é mais fácil ou
aceitável propor ecumenismo ou diálogo religioso com pessoas de outras religiões
não-cristãs (budismo, candomblé, etc.) do que com setores evangelicais e
pentecostais do cristianismo. Talvez seja por não conhecer textos teológicos
tão sérios e comprometidos como o que citei acima.
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